29.4.08

Eu trabalhei aqui...


Sempre que olho para esta imagem lembro-me como era especial trabalhar num complexo petroquímico. Esta paisagem industrial, com as luzes já acesas, ao cair da noite, é uma preciosidade que nem todos têm a sorte de compreender.

Assim se passaram dez meses da minha vida, com todos aqueles clichés patéticos da qualidade de vida, longe da confusão das cidades, sem trânsito e sem stress. Balelas. Em Portugal, viver fora de Lisboa é ter de renunciar a quase tudo. Ora, eu prefiro ter acesso a tudo e não ter tempo para metade. Em Sines, eu tinha tempo e aborrecia-me de morte (abençoado Kalorias, acreditem que eles não me pagam pela publicidade, mas aquele ginásio salvou-me a vida).

O trágico – cómico disto tudo é comprovar in loco e na própria pele a incompetência e inaptidão dos recursos humanos da companhia que, na Península Ibérica, é a que mais investe em formação e conhecimento. A mesmíssima Repsol YPF que tão bem intencionada é nos seus estudos de clima laboral e na sua tentativa de gestão por objectivos para premiar o mérito, a grande maioria das vezes só faz merda atrás de merda e consegue por isso dispor de uma grande quantidade de recursos humanos altamente insatisfeitos, que vão ficando sobretudo porque os espanhóis valorizam muito a estabilidade laboral (tiveram 20% de taxa de desemprego nos anos 80 e isso não se esquece facilmente).

Aqueles senhores pagaram-me uma pós-graduação de um ano em Madrid, mais bolsa de estudo, fizeram-me 50 biliões de testes de perfil, disseram-me "não pense que vai trabalhar para Portugal porque nós queremos gente com mobilidade geográfica" (e eu feliz e contente). No fim de tudo, ofereceram-me o posto "técnico de processos em Sines" e que sorte a tua, que vais ficar tão perto de casa e tens uma excelente carreira pela frente, 20 anos de Sines até seres directora do complexo. O raio que os parta. Depois passei o ano a dizer, “mas eu quero estar no estrangeiro agora”. “Eu também posso trabalhar em projectos relacionados com Sines, mas em Madrid”. Em troca, o melhor que consegui foi o comentário "tu tens muita pressa, daqui a dez anos vais ver que já viajas a Madrid".

E portanto, quando recebi um telefonema de outra empresa a perguntar "Ainda está interessada em viver e trabalhar em Madrid?", não tive grandes dúvidas nem grandes dilemas existenciais.

Faz agora um ano que entreguei a minha carta de demissão. O mesmo director de RH que me contratou disse-me "nós sabíamos que o teu perfil se enquadrava mais para os escritórios centrais, a gerir um grupo de pessoas, mas agora precisávamos de gente aqui." Numa entrevista de saída que fiz com um tipo de Madrid, ele agradeceu-me imenso a clareza com que lhe tinha explicado toda a situação, que batia tudo certo com os números que tinha, mas agora conseguia compreender o que realmente se passava. E que achava que eu tinha muito jeito para recursos humanos (medo).

No mês passado, soube que a Repsol trouxe, da Argentina para Madrid, mais uma pessoa para a gestão do projecto de Sines. Ri-me. Tontos. Podia ter sido eu, ficava-lhes mais barato e não tinham perdido um recurso humano em quem gastaram o que gastaram e que, caso tivessem feito as coisas bem feitas, teria sido o trabalhador mais dedicado do mundo. E, quando penso nisto, sei qual foi o meu erro: ter vontade própria. Nunca gostei que me impusessem nada.

7 comentários:

Restelo disse...

Realmente a escolha da Repsol foi muito estúpida... O bom de tudo é que saiste a bem com eles. Jinhos!

Anónimo disse...

Acho que o meu erro tb sempre foi ter vontade própria e às vezes até gostava de não a ter... ser a chamada ' vaca de presépio ' facilita muito as coisas. Fizeste a opção certa e o que dizes é certíssimo embora hoje em dia já se tenha que abdicar de muita coisa para trabalhar e viver em Lisboa .

Tiveste em Barcelona e eu passei a semana passada em Maiorca. Visitei a ilha toda de uma ponta a outra. Simplesmente magnífico !

Mtos beijos

Jo

Unknown disse...

Restelo,
eu acho que eles achavam que eu ia falar falar mas nunca fazer nada...

Jo,
que maravilha, ainda por cima estava bom tempo, aposto que te divertiste mesmo à grande! :)

Josefo Micios disse...

Grande crítica esta, mas infelizmente no q concerne aos RH's subscrevo tudo o q dizes e algo mais ainda... Eu, passados quase 6 meses depois de ter saído de lá e ao fim de 10 anos de trabalho pelos vistos não souberam o q estive a fazer durante todo esse tempo, dado q não me conseguem arranjar a &%&%$&# de um documento de descrição de funções :P

Felicidades Margarida, foi bom voltar a ver-te por estas bandas :)

(Carlota)

Unknown disse...

Carlota,
Nuno Carlota? Bons olhos te leiam!
Isso das funções é melhor que as escrevas tu, se não nem no dia de São Nunca à tarde!
Beijinhos!

Anónimo disse...

"Aqueles senhores pagaram-me uma pós-graduação de um ano em Madrid, mais bolsa de estudo"

Verdadeiramente vergonhoso o que te fizeram! Deves de facto "cuspir nesse prato"!...

1_12M

Unknown disse...

1_12M,

bem-vindo ou bem-vinda (...)

Nunca tive o hábito de cuspir em prato algum, que não nasci em berço de ouro e tudo o que tenho conseguido tem sido com muito trabalho e esforço.

A pós-graduação foi-me paga e a bolsa de estudo também. Aliás, se assim não tivesse sido não teria podido fazê-la, que não tinha dinheiro para isso.

Correu bem, aprendi muito e fartei-me de trabalhar. Tão bom foi que me acharam digna de me oferecer um posto de trabalho que, infelizmente, não tinha nada a ver com o que eu sempre declarei ambicionar. Vim-me embora, e lamento que me tenham perdido porque, modéstia à parte, sou muito boa. Mas é assim a vida. E um trabalho é um trabalho. Há um contrato, cada parte rescinde quando bem entender.

Cuspir no prato? Bolas, não faltaria mais nada! :)

Fica bem!